COVID E DOENÇA OCUPACIONAL: Análise da Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME

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COVID E DOENÇA OCUPACIONAL: Análise da Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME

A orientação se faz necessária em virtude do intenso debate surgido após a recente publicação da Medida Provisória nº. 927, de 22 de março de 2020, a qual previa, em seu art. 29, a seguinte redação: Art. 29. Os casos de contaminação pelo coronavírus (Covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.

Tal dispositivo teve sua aplicação suspensa em caráter liminar por decisão proferida pelo E. STF no julgamento das ADIs nº. 6344, 6346, 6348, 6349, 6352 e 6354. 4.

Em que pese a vigência da MP nº. 927, de 2020 ter sido encerrada sem a sua conversão em lei e as referidas ADIs terem perdido objeto, certo é que o debate acerca do nexo entre a COVID-19 e o trabalho extrapolou o disposto no art. 29 do referido normativo, exigindo a consulta a órgãos técnicos e jurídicos para uniformização da interpretação dos artigos 19 a 23 da Lei nº. 8.213, de 1991.

Um dos fundamentos da Nota Técnica é o fato de que a “Covid-19 é um risco biológico existente no local de trabalho”, por isso os empregadores seriam responsáveis pela busca de medidas adequadas que identifiquem os possíveis transmissores da doença e promovam o isolamento dos casos.

Causou bastante incômodo a nota técnica emitida pelo MPT, especialmente por considerar a COVID-19 como uma doença ocupacional, nos termos do art. 20, I, da Lei nº 8.213/91, e Anexo II do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99).

A Nota estabelece o dever das empresas de realizar a vigilância epidemiológica da saúde ocupacional dos seus empregados e indica aos empregadores, empresas, entidades públicas e privadas que adotem medidas, com objetivo de prevenir casos de COVID-19.

O COVID-19 somente será considerado como doença ocupacional quando a contaminação do trabalhador pelo vírus ocorrer em decorrência das condições especiais de trabalho, conforme estabelece o parágrafo 2º do artigo 20 da lei 8.213/91.

Destarte, pesa sobre os ombros do empregador a responsabilidade pela não proliferação do vírus, o que pode ser impossível, já que mesmo com todas as medidas de precaução de transmissão, a redução da propagação pode, muitas vezes, estar fora do controle do empregador.

A Secretaria Especial de Previdência e Trabalho emitiu Nota Técnica, no qual se destaca o objetivo de lincar o nexo de causalidade entre o trabalho e a COVID-19, e esclarece a interpretação jurídica dos artigos 19 a 23 da lei 8.213 de 1991.

Ressalta-se que, segundo esta nota técnica, a COVID-19 é uma doença comum, não se enquadrando no conceito de doença ocupacional, mas segundo a orientação da Secretaria, pode ser enquadrada como doença do trabalho, nos termos do artigo 20, inciso II: “doença adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente”.

Nos termos do § 2º do mesmo artigo 20, ainda, essa patologia viral poderia ser reconhecida como doença ocupacional.

Os esclarecimentos prestados pela Nota Técnica SEI 56376/2020/ME tratam sobre a necessidade de concessão ou não de benefícios previdenciários aos que contraírem a COVID-19, comprovadamente em ambiente de trabalho, ou seja, a depender da comprovação de que há nexo causal entre o trabalho e a contaminação é que se poderia falar da doença como adquirida em ambiente laboral, vale dizer, não se pode presumir a contaminação.

Essa constatação, porém, será realizada pela Perícia Médica Federal. Ou seja, haverá necessidade de estabelecimento do nexo a partir de elementos submetidos para análise dos peritos médicos federais”.

Por fim, com base no pronunciamento do Ministério da Economia, evidencia-se que esta Nota será aplicada, exclusivamente, no âmbito da legislação previdenciária, de modo a esclarecer a “possibilidade de caracterização da Covid-19 como doença ocupacional para fins de definição da natureza do benefício previdenciário a ser concedido (acidentário ou não acidentário)”.

Há, portanto, duas conclusões possíveis:

A primeira conclusão, empreendida pela Nota Técnica do MPT, é de que a COVID-19 seria considerada, de imediato, como doença profissional, e de que é responsabilidade dos empregadores tomar medidas para a não proliferação da doença, e, outrossim, emitir Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT).

No entanto, o MPT não considera a necessidade de comprovação técnica, especialmente pela realização de perícia médica para atestar, de fato, a contaminação em ambiente de trabalho.

Com base nisso, “o funcionário afastado pela Previdência Social por mais de 15 dias e que recebesse auxílio-doença teria direito à estabilidade de um ano”2, além de poder reivindicar danos morais e materiais, além de fazer jus aos depósitos do FGTS e poder gozar de estabilidade acidentária.

O entendimento do MPT, sem dúvidas, tem consequências imensuráveis ao empregador, na medida em que o empregador não tem controle sobre a doença e sequer conhecimento do possível local da  transmissão/contaminação.

Quanto à segunda conclusão, decorrente da Nota Técnica da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, afirma-se que a COVID-19 pode ou não ser doença ocupacional, dependendo da perícia médica a ser realizada para identificar o nexo causal entre o labor e a contaminação.

Isso também trará consequências, como as empresas “terem alíquota maior de Riscos Ambiental do Trabalho (RAT)”³, em razão do aumento do número de acidentes de trabalho.

Nota-se, que o entendimento da Nota Técnica da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho parece-nos mais brando, especialmente por considerar a COVID-19 doença comum, mas que pode ser adquirida em ambiente de trabalho e, a depender da cabal demonstração do nexo de causalidade, pode ser considerada doença ocupacional, mediante parecer da perícia médica, que tecnicamente identifique o nexo entre causa e efeito, não havendo a possibilidade de presunção da doença como uma doença de trabalho.

Compreende-se, ao final, que não se pode considerar a COVID-19 imediatamente como uma doença ocupacional, sem que haja prova técnica cabal que efetivamente demonstre a aquisição da enfermidade em ambiente de trabalho, e que tal comprovação depende de prova técnica médica.

Fica a dúvida acerca da forma de condução da perícia técnica para que o Perito Oficial conclua pelo nexo causal com o ambiente de trabalho ou não, sendo que tal matéria, seguramente, será objeto de vasta discussão judicial em nossos Tribunais.



Fernanda Rocha

Advogada e gestora jurídica, atuando nas áreas empresarial trabalhista, consultivo, contencioso administrativo e judicial em empresas de médio e grande porte no segmento publico e privado. Pós-graduada em Direto Previdenciário pela Faculdade Arnaldo - 2020. Pós-graduada em Direto Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, 2007


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